Vai ter golpe em 7 de setembro?

Um apanhado das notícias dos últimos dias sugere uma conclusão clara, embora pouca gente esteja disposta a repeti-la em voz alta

Imagem: Sérgio Lima / Poder 360
por Alexandre Lessa da Silva

Não, essa é a resposta. Começo cravando logo essa previsão, algo que não vejo ninguém fazendo, por estar cheio dessa tática medíocre de ameaça de golpe a todo instante. “Cão que ladra não morde”, e esse cachorro já está ladrando há muito tempo, o Brasil tem que parar de temer essas narrativas vazias de um grupo que nem sequer sabe o significado da palavra “narrativa”.

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Pode haver conflito e enfrentamento? Sim, é tudo que Bolsonaro quer. Entretanto, para explicar minhas afirmações, é necessário começar o artigo e sair desse preâmbulo pessoal, feito para aqueles que são fãs de um spoiler.

Bolsonaro, já há algum tempo, ameaça, nunca diretamente, aproveitar a data simbólica de 7 de setembro para dar um autogolpe. Entretanto, ele sabe que não há espaço para isso na atual conjuntura nacional e internacional, como será demonstrado, fazendo de suas ameaças uma tentativa de demonstração de força para que possa tentar virar o jogo e, ao mesmo tempo, incrementar sua tática do conflito, pois sem ela não há bolsonarismo. O comandante do Executivo tentará inflamar seus 12 por cento da população com mais de 16 anos que formam seu núcleo duro e que apoiam, mais do que acreditam, todas as suas palavras.  Essa porcentagem não lhe garante apoio suficiente para um golpe, mas, por toda sua louca militância, garante pelo menos a aparência de que há um exército de fanáticos dispostos a morrer para atender aos interesses de seu presidente. Aqui, temos a minoria tentando calar a maioria, conforme demonstram todas as pesquisas, e impor sua vontade heterônoma, pautada apenas nas orientações fascistas de um extremista que governa o país.

O objetivo de inflamar esse núcleo duro – chamado também de grupo heavy do presidente – é fazer com que o governo Bolsonaro não acabe antes da hora e, somente aí, com as eleições de 2022, tentar eleger Bolsonaro ou dar continuação, através de uma ruptura institucional, ao golpe que começou com o ilegal impeachment de Dilma. Portanto, a grande preocupação deve ser guardada para as próximas eleições, e não para o 7 de setembro.

Bolsonaro não tem, pelo menos no momento, o apoio irrestrito do topo da pirâmide econômica. FIESP e FEBRABAN já preparam um manifesto que contraria os desejos autoritários de Bolsonaro, empresários mineiros, discordando de um ataque ao STF promovido pela FIEMG (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais), decidem tornar público um manifesto que defende a democracia e a Faria Lima, símbolo da chamada “elite nacional”, começa a desembarcar – é verdade que muito vagarosamente – da canoa furada do governo. Some-se a isso o manifesto do agronegócio que, embora muito fraco, demonstra insatisfação com os posicionamentos do presidente. É evidente que banqueiros e grandes empresários não estão preocupados com a liberdade e a democracia, pois, se fosse assim, não teriam ajudado, e muito, a eleger Bolsonaro. O que acontece é que eles precisam, para conseguir lucro, de segurança jurídica e instituições minimamente sólidas, sem isso, o capitalismo vira algo muito arriscado, algo a que a burguesia tem horror.

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Outro fator que deve ser analisado também é a volta do funcionamento da Justiça e da imprensa crítica em relação ao governo. Denúncias, como a mais recente, feita por um ex-empregado da família Bolsonaro que revela supostos crimes de membros dessa família, pululam a todo momento na imprensa. O Poder Judiciário, por sua vez, já foi responsável pela prisão de diversos apoiadores do presidente e pela descapitalização de páginas bolsonaristas. O Poder Judiciário age, agora, de uma forma bem diferente do que fazia na época do maldito tuíte do general, não menos maldito, Villas Bôas. Diante dele, o STF garantiu, através de Dias Toffoli, que Lula não seria solto.

O Poder Legislativo, apesar do aluguel feito por Bolsonaro do Centrão, também demonstra que não está apoiando um novo golpe. A CPI do Genocídio espalha para todo Brasil as ações do governo que resultaram na morte de milhares de brasileiros e em crimes, pelo menos supostos, praticados por diversos membros do Poder Executivo. A cada dia, a CPI chega mais perto do presidente, naquilo que é divulgado. No que não é, certamente já chegou a esse objetivo. A última grande derrota de Bolsonaro aconteceu, também, no Senado. A Medida Provisória 1.045, conhecida como minirreforma trabalhista, foi derrotada nessa casa: 47 senadores votaram contra a retirada de direitos trabalhistas dos brasileiros, contra 27 que votaram a favor, mostrando, assim, um descontentamento com as políticas governamentais e os anseios do presidente. Um dia após essa votação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que a democracia e o Estado de Direito são inegociáveis, no encontro que manteve com governadores. Evidente que são, uma vez que sem eles não há Congresso e, muito menos, eleições.

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No campo da política externa, Bolsonaro também não está bem. Sua única chance, para ter qualquer importante apoio internacional, é ser lacaio dos Estados Unidos. Contudo, mesmo esse papel está sendo muito mal executado.

Em 5 de agosto, houve uma visita estadunidense a Brasília que causou uma grande desconfiança por parte da esquerda. Nela, o conselheiro de Segurança dos Estados Unidos, Jake Sullivan, foi acompanhado pelo diretor sênior do Conselho de Segurança Nacional para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Juan Gonzalez; diretor sênior de Questões Cibernéticas, Amit Mital; diretor sênior de Tecnologia e Segurança Nacional, Tarun Chhabra; conselheira sênior, Ariana Berengaut; e o diretor para o Brasil e Cone Sul, Andrew Sanders, bem como do Oficial Sênior de Assuntos para o Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, Ricardo Zúniga” e o encarregado de Negócios Doug Koneff. Essa delegação é formada pelas autoridades de mais alto escalão que já visitaram o Brasil desde que Biden assumiu. Pelo que foi narrado pelos participantes estrangeiros, a conversa com Bolsonaro foi tensa e repleta de nonsense, o que era de se esperar. Bolsonaro, diferente de seus visitantes, não usava máscaras e chegou a declarar que a última eleição presidencial nos Estados Unidos foram roubadas, o que faria de Joe Biden um presidente ilegítimo. Apesar disso, foi oferecido ao Brasil o status de parceiro global da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), o que daria ao país acesso à compra de equipamentos bélicos impensáveis para os padrões de nossas Forças Armadas, além de treinamentos com as Forças estadunidenses. As exigências do Império, nessa reunião, foram, segundo a BBC: redução das queimadas e desmatamento, rejeição, por parte do Brasil, do 5G da chinesa Huawei, e eleições livres e limpas. Juan Gonzalez, um dos participantes da reunião é um grande crítico de Bolsonaro e confirmou a afronta de Bolsonaro e todos os pontos abordados, além da discussão sobre a entrada do Brasil no Conselho de Segurança da ONU.

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Pelo que se pode extrair da imprensa estadunidense, o principal interesse dos Estados Unidos é que o Brasil não use a tecnologia 5G da empresa chinesa, pois estão preocupados com o avanço da influência da Rússia e, principalmente, da China na região, sendo o Brasil, para isso, visto como um “key player” (protagonista) para os interesses estadunidenses.

Melvyn Levitsky, professor de política e prática internacional da Ford School e ex-embaixador dos EUA no Brasil (1994-1998 – governo democrata de Bill Clinton), chegou a afirmar, no ano passado, que “há uma tempestade perfeita contra a presidência de Bolsonaro. Acredito que as chances agora são a favor de sua remoção do cargo. Ele fez campanha para livrar o país da corrupção endêmica, mas mostrou através de suas nomeações e recompensas aos seus filhos que ele está infectado pela mesma doença política.” Complementa, ainda, dizendo que o golpe final “poderia vir dos militares — não através de um golpe como em 1964, mas sim através da pressão sobre o Congresso e os tribunais para avançar com as investigações e eventual impeachment.” Isso demonstra o descontentamento dos democratas com Bolsonaro e a pressão que os Estados Unidos devem estar fazendo para que os militares segurem Bolsonaro.

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Os Estados Unidos estão cozinhando Bolsonaro em banho-maria, o que afasta ainda mais o perigo de um golpe em 7 de setembro. A grande preocupação dos brasileiros que pensam deve ser com as próximas eleições, uma vez que será a última chance de Bolsonaro e os militares tentarem dar o golpe. Por enquanto, Bolsonaro não passa de um rato que ruge e nada mais. Contudo, devo deixar um aviso: Bolsonaro quer o conflito que sempre o fortalece, dando desculpa para o argumento da falta de ordem pública e, com isso, ameaçar mais uma vez com uma intervenção, coisa que não ocorrerá, mas privilegia o seu discurso eleitoral.

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