#FlautaVertebrada: “Que o poema / Não pareça / Frio construto / E seus fins, / Mas fruto / Cujo fim / Seja não ter / Qualquer fim”

por Felipe Mendonça
Há lógica
Na lógica
Do poeta?
Sim, por certo,
Como há lógica
No voo de um pássaro,
Mas não como há lógica
No voo de um jato.
Como há lógica
No pulo do gato,
Nas flores que nascem
No meio do mato,
No beijo, no ato, no cacto,
Porque a poesia
Não é um jogo de dados
Nem cláusula de contrato.
Há lógica
Na lógica do poema
Como há na pena
Ou no chilro
Da ave que gorjeia,
Como no voo da abelha
Ou no adejo,
De flor em flor,
Da borboleta,
E, então, traduzi-la
Em metáfora,
Em palavra,
Em som,
Em letra,
Em mar…
Há tanta lógica
No poema
Quanto há na borboleta,
Em vê-la
E imaginá-la,
Em sonhá-la
E escrevê-la,
Depois de vivê-la,
Suas asas, cores
E antenas
Em palavras
E lógica
Que nos transmitam
Todo o apuro
E leveza
Do que acertaram chamar
De beleza.
Que o poema
Seja lógico,
Não como um relógio
Ou um edifício,
Mas como joia,
Luz pela claraboia
A iluminar-lhe
O corpo físico.
Que o poema
Não pareça
Frio construto
E seus fins,
Mas fruto
Cujo fim
Seja não ter
Qualquer fim,
Senão aquele
Que faça sentido
Para mim,
Senão aquele
Que, não sendo prévio,
Seja de fato
Meu olhar
Sobre os pássaros,
Cactos, prédios
E o mar…
Felipe Mendonça é poeta e ensaísta brasileiro, nascido em 1976, em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, que cresceu no Rio de Janeiro no bairro da Ilha do Governador. Hoje vive em Belford Roxo/RJ. É mestre e doutor em Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Administra um blog de poemas chamado “Poesia, necessário pão” em que publica poemas de sua autoria, tendo publicado em 2018, pela Chiado Books, um livro de poemas intitulado “Reescritos”. Escreve n’O Partisano quinzenalmente às segundas-feiras.