Como mulheres e partisanos soviéticos derrotaram os nazistas

por Alexandre Flach

O texto abaixo é a décima-segunda parte da série Fogo e revolta nas ruas: para onde vai a luta popular?

Resistência ao fascismo burguês se faz na bala. Ninguém sabe melhor disso do que o povo russo. E em particular as mulheres. Já vimos aqui que elas foram o estopim da Revolução Russa, não é de se surpreender então que quisessem estar junto aos homens, no campo de batalha, arrancando sangue dos nazistas. E para isto enviaram centenas de cartas diretamente para o camarada Stálin, implorando que fossem aceitas para lutar em aviões, tanques de guerra ou até mesmo apenas com fuzis nas mãos. 

E não poderiam faltar também os partisanos! Civis em terras russas ocupadas aliavam-se a soldados do Exército Vermelho que haviam escapado dos alemães e formavam tropas de guerrilha. Verdadeiras tropas de elite em missões especialmente dolorosas para Hitler. 

A vitória dos russos sobre os fascistas não foi feita só pelo alto comando ou por líderes geniais. Foi principalmente a vitória do povo livre sobre aqueles que os queriam reduzir a escravos. Um exemplo para todos nós.

Lugar de mulher russa é no tanque T-34

As mulheres soviéticas começaram a ser aceitas para o serviço militar a partir de 1939, mas normalmente ficavam em cargos de apoio, no correio ou como enfermeiras e médicas. Aproximadamente 70% dos feridos de guerra soviéticos foram tratados por mulheres. Ainda assim, muitas atuaram diretamente na frente de batalha. Várias por pedido direto a Stálin.

Maria Oktiabrskaia havia acabado de perder seu marido para os nazistas. Com sede de vingança, decidiu se recrutar. A burocracia russa negou seu pedido: com 36 anos, era “velha” para o front. Obstinada, foi cutucar o seu líder maior, Stálin. Escreveu uma carta direta para a autoridade máxima da União Soviética. Disse que queria lutar e os motivos. Informou também que acabara de vender as suas posses e estava doando tudo para a construção de um T-34. Stálin aceitou o seu pedido. Alguns meses depois, estava a bordo de seu tanque de guerra, o “Namorada Decidida”. Foi a primeira mulher soviética a conduzir um blindado, mas logo outras mulheres seguiram o seu exemplo.

“Eu estou golpeando os bastardos. Eles me fazem ver vermelho”, disse Oktiabrskaia para sua irmã em uma carta. Imagem: reprodução

Ekatarina também achava que seu lugar era no tanque de guerra. A bordo de seu T-60 —  um tanque leve que usava peças do setor automobilístico — destruiu fortificações e outros carros blindados em Stalingrado e na Ucrânia. 

Certa vez, salvou a vida de vários oficiais que trazia em seu tanque. Durante a noite, percebeu que estava entrando em um campo minado. Parou a três metros das minas. Questionada sobre o que a fez perceber as minas, nunca soube dar uma resposta adequada. Intuição feminina?

“Quando me disseram que o tanque seria dirigido por uma mulher, fiquei com medo. Eu pensei que, talvez, seria melhor ir andando… Mas como ela conseguiu sentir o campo minado?” Lembrou o capitão Lepetchin muitos anos depois. Imagem: Arquivo Estatal da Região de Omsk

Mais do que intuição ou obstinação, elas tinham coragem. E muita! Aleksandra Samusenko seguia a bordo de seu T-34 na batalha de Kursk, uma das mais sangrentas da Segunda Guerra, enfrentando três tanques Tiger alemães, tecnicamente superiores aos soviéticos. Os machões da tripulação entraram em pânico. Aleksandra foi categórica: “Não há caminho de volta para nós!”. Depois de colocar ordem na casa e após horas de confronto, venceu a batalha.

Sorrindo para a morte, Aleksandra venceu três tanques Tiger alemães, muito superiores ao seu T-34: “Não há caminho de volta para nós!” Imagem: reprodução

Bruxas da noite

Também foram cartas enviadas diretamente a Stálin o que deu origem ao primeiro regimento feminino de aviadoras da União Soviética: o 46º Regimento da Guarda, as “Bruxas da Noite”.

Operando em aviões de baixa velocidade, apenas à noite e sem sequer instrumentos de rádio — que eram a principal ferramenta para localização na aviação até a invenção dos GPS — as 115 garotas, entre 17 e 22 anos, partiam para a batalha carregando bombas até mesmo nos joelhos. 

Desligando os motores, seguiam em absoluto silêncio, impossíveis de serem detectadas pela vigilância antiaérea nazistas, e despejavam bombas no inimigo, muitas com a inscrição “pela pátria”, que logo foram substituídas pelos nomes das companheiras mortas em batalha. Trinta e três delas não viveram para ver a vitória sobre os nazistas. 

Moças do 46º Regimento da Guarda — as “Bruxas da Noite”. A única divisão feminina de bombardeio noturno do mundo. Imagem: TASS

A dama da morte

Muitas mulheres eram também designadas para a artilharia. Algumas se destacaram como excepcionais atiradoras de elite. A maior delas, sem dúvida, foi Lyudmila Pavlichenko, conhecida como a Dama da Morte, por ter livrado o nosso planeta de 300 nazistas, em menos de um ano de combate. No total, as mulheres-snipers mandaram para o inferno mais de 11.200 oficiais e soldados do Führer.

Lyudmila Pavlichenko, a “Dama da Morte”. Imagem colorida por Olga Shirnina

Partisanos soviéticos

Partisano é um cara que não aceita ver o seu país ser ocupado ou dominado por uma potência imperialista e vai à luta. Junta outros companheiros e segue para a batalha, mesmo que não exista nenhuma organização centralizada no comando. Claro que na União Soviética eles não poderiam deixar de estar presentes. 

Os Partisanos soviéticos normalmente estavam localizados exatamente nos pontos mais delicados para a estratégia nazista: atrás das frentes de combate alemãs. Eram cidadãos comuns, ex-soldados do Exército Vermelho, e até alguns oficiais que tinham escapado dos nazistas. Verdadeiros guerrilheiros, especialistas em atravancar a comunicação, sabotar a logística ou até em roubar armas e munições do inimigo, também tiveram que enfrentar os alemães diversas vezes em combates diretos.

Partisanos da Ucrânia, Bielorrússia e de áreas próximas a Smolensk, Oriol e Leningrado, por exemplo, chegaram a detonar um total de 215 mil bombas em linhas ferroviárias, descarrilhando mais de mil trens e destruindo dezenas de pontes. Resultado: o transporte e o tráfego de alemães para a URSS acabou caindo em 40%

Com milhões de soldados nazistas para alimentar, municiar e até mesmo, substituir, os Partisanos russos sem dúvida foram uma das grandes dores de cabeça de Hitler, e certamente decisivos na vitória soviética, que, como vimos aqui, deveu-se em grande parte à superioridade logística da URSS.

Os partisanos foram responsáveis por diminuir em 40% o transporte e tráfego nazista. Imagem: Nikolai Petrov/TASS

Missão: exterminar os partisanos

Com o avanço das tropas soviéticas, Hitler tentou se concentrar um pouco em acabar com o “problema partisano” e mandou 30 mil soldados, apoiados por aviação, artilharia e tanques. Era a Operação Sturmwind. Pobre Führer… mesmo estando em total desvantagem numérica — eram 3 mil partisanos cercados na floresta de Janowskie — a operação não obteve êxito.

Os partisanos não só resistiam ferozmente mas também contra-atacavam. E, num desses contra-ataques, conseguiram capturar várias armas de artilharia que os ajudaram a quebrar o cerco. Em uma determinada noite conseguiram escapar deixando 600 nazistas mortos e 1.400 feridos para trás. O inimigo não se atreveu a segui-los.

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