“Em certo sentido, cabe ao fotógrafo de arquitetura recuperar na imagem construída o traço do arquiteto que a projetou”

por Danilo Matoso
Joana França é brasiliense, arquiteta e fotógrafa. Não necessariamente nessa ordem: são atributos entrelaçados que se refazem, uns aos outros. Explico. Ela nasceu em Brasília, mas se fez brasiliense nas milhares de fotos que fez da cidade desde que se lançou nesse ofício há cerca de dez anos. Na mesma época, pouco antes, ela se formara em arquitetura — ofício de seus pais — e foi como arquiteta que se fez fotógrafa. Uma boa fotógrafa: certamente, hoje, uma das primeiras opções dos arquitetos para registrar suas obras.
Seu interesse pela fotografia surgiu ainda no curso de Arquitetura e Urbanismo da FAU-UnB, quando da passagem do fotógrafo alemão Michael Wesely pela Capital em 2002. Formada em 2003, oscilou entre diversas atividades da arquitetura até 2011, quando estudou no International Center of Photography e retornou resolvida a se dedicar exclusivamente à fotografia.

Entre 2005 e 2006, trabalhamos juntos no projeto da sede da FHE. Desde então, nos tornamos amigos. Em 2011, editamos Brasília: roteiro de arquitetura, caderno de notas. É um caderno de bolso em que constam autores, endereços, datas e fotos em preto e branco de mais de 250 obras de arquitetura na cidade. Naturalmente, as fotos foram encarregadas a Joana que, junto ao designer Ricardo Theodoro, optou pelo formato quadrado – algo especialmente conveniente na era do Instagram.
A série do Roteiro, por sua abrangência e unidade, nos permite vislumbrar algumas das características próprias da fotografia de arquitetura em geral e do trabalho de Joana em particular.
A fotografia de arquitetura é parte de um processo cultural determinado. A publicação das obras construídas por meio de fotos, junto aos desenhos originais e um texto explicativo é necessária aos arquitetos não apenas como uma maneira de conseguir mais trabalhos, mas também de dialogar com o restante do campo profissional. As fotos são parte da documentação que, multiplicada à exaustão, amplifica o valor cultural da obra (de outra maneira vista somente por aqueles com condições de visitá-la). Em certo sentido, cabe ao fotógrafo de arquitetura recuperar na imagem construída o traço do arquiteto que a projetou. Essa retificação do desenho, se podemos chamá-la assim, implica determinadas relações entre as margens retas como as de uma folha de papel, as verticais dos edifícios cortando a talhos de esquadro a força da gravidade, as horizontais feitas a régua paralela a multiplicar em pavimentos a planta de rés-do-chão.

Joana entende essas questões perfeitamente, e isso é fundamental nessa série cujo objetivo é identificar centenas de edifícios de uma cidade e — por que não dizê-lo — identificar a cidade por meio da arquitetura que conforma seu traçado. Em cada um dos quadradinhos de 2,5cm X 2,5cm, ela foi capaz de escolher o ângulo, a luz, o enquadramento, capazes de dar a conhecer um edifício tanto em sua geometria ampla quanto nos detalhes de seu invólucro. É uma tarefa de síntese e de escolha: há edificações que só podem ser compreendidas como massas construídas, enquanto outras se caracterizam por um detalhe, um elemento, uma fachada.
Por ocasião do 60º aniversário de Brasília, o Conselho Federal de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (CAU/DF) viabilizou a terceira edição do Roteiro – disponível gratuitamente na sede do órgão. Os que o tiverem em mãos poderão apreciar na íntegra esse notável trabalho de Joana, além da excelente arquitetura da Capital.













Excelente reportagem, necessária denúncia de depedeacao de patrimônio cultural.