A presença de Lula nos atos continua sendo motivo de debate, enquanto isso, Paulo Guedes mostra ao mundo como ser um neoliberal com maestria

por Vinícius Carvalho
Não adianta, para um setor da militância Lula só é válido se estiver com um macacão sujo de graxa, no alto de um caixote na avenida Paulista, fedendo a pinga, cecê debaixo do suvaco e berrando num megafone. Lula faz certo em não participar dos atos de rua.
Lula, hoje, infelizmente, é muito maior que a esquerda brasileira. Se o camarada vai aos atos, vão acusá-lo de campanha antecipada, apropriação de pautas e hegemonismo. Pior, qualquer evento tido como negativo – desde queima de estátuas, depredação de bancos, pontos de ônibus, porradaria, vaias ao Ciro Gomes, espancamento de tucanos por parte do PCO – será vinculado ou creditado a ele. Com um agravante, se a manifestação, por algum motivo “flopar”, ou seja, ficar aquém do esperado, o jogo narrativo de desconstrução e desmobilização do campo progressista é imediato: está fortalecida a tal terceira-via.
As últimas manifestações foram severamente mal divulgadas e mesmo assim foram grandes, mas menores que a do dia 7 de setembro, de Bolsonaro. Lula não pode participar de ato menor que o de Bolsonaro. Não é orgulho, é semiótica. “Simples assim”, como diria o glorioso Paulo Palavra. Cabe lembrar apenas uma coisa, sem arrogância, Lula está em outro patamar. Bolsonaro ainda sabotava e se recusava a comprar vacina até exatamente dia 8 de março deste ano. O que ocorreu nesta data, meus amigos? Fachin anulou as condenações de Lula na operação lava-jato, na teoria devolveu os seus direitos políticos e, no mesmo dia, Lula fez um discurso apoteótico no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e que foi, até então, o evento de maior audiência do ano e que gerou um engajamento maior até que o BBB.
Na tarde do mesmo dia, pouco após o discurso de Lula, Eduardo Bananinha publica um cartoon com o Zé Gotinha segurando uma vacina em forma de fuzil. Dali em diante, com Lula novamente no jogo político, Bolsonaro entendeu que não daria para roubar sozinho e atrasar a vacinação na marra, ele precisaria acelerar o processo.
Paulo Guedes, o neoliberal perfeito e exemplar
Se engana quem se surpreende com o grau de banditismo de Paulo Guedes. O ministro da Economia é o neoliberal perfeito, ele entrega exatamente o que o modelo econômico que ele foi “contratado” para praticar defende. Miséria, espoliação, precarização das relações de trabalho e da vida humana por um lado, máximos lucros para especuladores do outro.
Mas ele não seria permitido fazer isso sem um forte arcabouço cultural que o legitimasse. Resumindo, o que fez com que suas ideias e teorias fossem e sejam aceitas eram aquelas já defendidas por Temer e Bolsonaro. Mas lembram do passo a passo de como isso ocorreu?
O início do refluxo econômico brasileiro, o período do “Fora, Dilma” se chocou com uma grande contestação nacional acerca do papel do Estado nas relações econômicas. As pessoas — classe média tradicional, remediada, e classe C principalmente — acreditavam que o Estado era culpado pelo fato das pessoas não serem mais ricas. Época de funk ostentação, época onde 9 em cada 10 fotos na timeline das redes sociais eram de combos de Absolut e RedBull nas Quintanejas, época onde qualquer feriadinho, era um tal de gente indo passar o “findi” na Disney, etc.
O brasileiro médio acreditou existir uma conspiração entre o PT e a Carga Tributária brasileira, que era só tirar os dois que o Brasil viraria Miami. E toma-lhe meme na internet comparando o preço do Camaro nos EUA com um Gol Bolinha no Brasil, com o preço de um iPhone da última geração nos EUA com um Motorola Tijolão no Brasil. “Tão vendo aí, que absurdo, culpa do PT e blablablá”. A classe média (nos seus nichos já citados acima) brasileira supunha que a sua prosperidade era fruto de mérito próprio e, claro, do coitado de Deus… Como diria o Almir Guineto, “Tudo que se faz na Terra, se coloca Deus no meio. Deus já deve estar de saco cheio…”
As pessoas não consideravam, nem por um pentelho de segundo, que aquele período de prosperidade era fruto, justamente, de uma política internacional e econômica bem sucedida.
E a solução para que o povo atingisse uma indubitável riqueza e todos nós virássemos uma espécie de “Luís Miranda USA” era repetir o mantra “NÃO EXISTE ALMOÇO GRÁTIS”.
“Então vamos acabar com o Bolsa Família, com o bolsa isso, bolsa aquilo, é muita mamata, %+#$%$%$ (palavrão), acabar com os direitos trabalhistas, com a obrigatoriedade das companhias aéreas de levar bagagens no voo que vai ficar tudo mais barato, todo mundo mais rico… Afinal o estado sustenta essa vadiagem toda aí, é muito direito…” Aí entrou o Temer e como não existia mais almoço grátis, a primeira coisa que ele fez foi alterar a forma de precificar os derivados de combustível fóssil e amarraram tudo no dólar. De cara o preço da gasolina, diesel, gás de cozinha FOI PRAS PICAS.
Depois alteraram a legislação trabalhista, afinal, não existe almoço grátis e trabalhador que quer o modelo de CLT é tudo vagabundo, né non? A massa salarial despencou e vejam que coincidência, consumo despencou também. Um monte de lojista que tava acreditando que Irajá ia virar Miami falou e se viu mais próximo do Morro do Papel Cagado. Mas aí a culpa não era mais de Deus e nem dos méritos próprios. Tem um fator curioso, parece que Deus só se mete na economia quando o país tá bem. Quando o país tá não, Ele some.
Chega o governo Bolsonaro e, feito um Napoleão de hospício, começa a agredir todos os países parceiros, França, Alemanha, Noruega, Portugal, Japão, China, etc. Todo mundo virou comunista-globalista. Paulatinamente o dinheiro vai fugindo do país, afinal, qual nação séria vai querer investir num país crackudo? O dólar vai disparando por que, não existe almoço grátis e mesmo com metade da população na merda, nós temos de continuar remunerando rentista e amigo do Paulo Guedes, além de claro, o próprio.
Como, novamente, não existe almoço grátis, o ministro da saúde Mandetta, expulsou os médicos cubanos do Brasil e estava numa onda de querer privatizar o SUS. Afinal, é insuportável essa coisa de atendimento gratuito e universal, pobre fazendo hemodiálise, etc. Até que chegou a pandemia e essa turma toda aí acima, que transformou um país no esgoto, ladeado com um monte de hospital privado começam, veja vocês, a distribuir cloroquina e ivermectina de graça. Ali existia almoço grátis? Muito mal contado, claro.
Só o que não foi nada mal contado, foi como agora mais de 119 milhões de brasileiros nem mais condições de almoço grátis possuem. A moeda derreteu, a economia foi para o espaço na nave em formato de pica do Jeff Bezos, e não deve voltar tão cedo.
Porque existe almoço grátis para Paulo Guedes, e os neoliberais perfeitos. Quem paga o almoço grátis deles são aqueles corpos pretos que estavam catando resto de sebo e osso podre, num caminhão no Centro do Rio.