Sentado à beira do caminho | por Andri Carvão

#FlautaVertebrada: “as árvores alinhadas, as árvores lineares, / paisagem reflorestada – futura paisagem desértica”

Imagem: serafima
por Andri Carvão

Sentado à beira do caminho
vejo a vida passar,
deixo a vida passar
e ela passa serelepe, lenta e lépida;
passa boi, passa boiada
e um boiadeiro passa
açoitando o ar com duas varas
arrancadas da terra – ‘Ê ê ê boooi!’ –
levantando a poeira amarela
da estrada.

Sentado à beira do caminho
numa rocha lisa, quase um tijolo cinza,
enraizada como uma planta de pedra
tendo às minhas costas uma cerca de madeira
e arame farpado; e por detrás dela,
a propriedade
do Homem, o patrão da região;
e logo ali ao longe
e ao largo,
as árvores alinhadas, as árvores lineares,
paisagem reflorestada – futura paisagem desértica;
mais adiante, a vegetação original;
e afastada de tudo isso,
no horizonte distante,
a silhueta da cadeia de montanhas
refletida no rio que demarca os limites
da fronteira entre o firmamento e o humano.

Sentado à beira do caminho
a sombra projetada no chão
de uma ave que risca o céu

com seu canto irretocável.

Sentado
à beira
do caminho
rumino algumas palavras caladas.

 

Andri Carvão cursou artes plásticas na Escola de Arte Fego Camargo em Taubaté, na Fundação das Artes de São Caetano do Sul e na EPA – Escola Panamericana de Arte [SP]. Graduando em Letras pela Universidade de São Paulo, o autor tem diversas publicações online e antologias. Um Sol Para Cada Montanha [Chiado Books, 2018], Poemas do Golpe [editora Patuá, 2019] e Dança do fogo dança da chuva [editora Penalux], entre outros. Escreve n’O Partisano quinzenalmente às terças-feiras.

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