Salto | por Deborah Dornellas

#FlautaVertebrada: os dilemas colocados diante da travessia do tempo, sua contemplação e suas possibilidades, em queda livre rumo ao desconhecido futuro

Imagem: Shutterstock
por Deborah Dornellas

daqui a dois passos

posso despencar num abismo

e nunca chegar ao fundo

ou

tropeçar e cair no chão árido

das margens do buraco

e me salvar da queda livre

ou

construir uma ponte pênsil

e atravessar a garganta

onde lá embaixo

ruge o rio turvo

ou

desenhar um trampolim

pronto para o mergulho

e saltar de olhos fechados

ou

tecer uma teia no vazio

e me enredar nela

para capturar insetos

e comê-los inteiros

mortos ou vivos

se estiver com fome

ou

chegar a um espelho d’água

onde enxergue minha imagem refletida e ela me diga: teu nome é narciso

ou

acorrentar meus tornozelos

a uma pedra imensa

com destreza formidável

então

bater muitas vezes as asas que não tenho para alçar voo sobre o vale

de onde veria que tudo se move

ou

perceber simplesmente

que o espaço

é o cumprimento

do tempo

 

Deborah Dornellas, carioca criada em Brasília, vive em São Paulo desde 2011. É escritora, jornalista, tradutora e aprendiz de artista plástica. Por cima do mar (Patuá, 2018), seu romance de estreia, venceu o Prêmio Literário Casa de las Américas 2019, na categoria “Literatura Brasileira”.

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