Bar legal

“Eu só quero saber como será a minha vida sem o Juarez, o arroz biro biro e a melhor geminha mole da cidade”

Imagem: AZdesign
por Tom Cardoso

Enquanto se abre um Outback por mês em São Paulo, um bar legal é fechado. Formaremos uma geração inteira de jovens sem caráter, alimentada à base de Ice and Fire Banana Cobbler e chope com gelo sem colarinho. Depois não reclamem.

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Eu só quero saber como será a minha vida sem o Juarez, o arroz biro biro e a melhor geminha mole da cidade.
Fui almoçar ontem num restaurante da Vila Madalena, com mesas na calçada. Pedi um negroni, comecei a beber em jejum, na esperança de não desmaiar antes de a comida chegar.

Tinha pedido uma das minhas combinações favoritas: carne assada com arroz biro biro, farofa, dois ovos fritos e duas bananas cozidas, prato que não faz parte do cardápio, mas nada que o Juarez, o garçom mais gentil de São Paulo, não resolva.

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Meia hora depois, o Juarez trouxe o rango. Quase bêbado, fui dar um cutucão com o garfo na banana, quando um cara, do nada, parou na frente da mesa. Percebi pela cor do dedão e pelo poncho fedendo a bunda de cachorro que se tratava de um mendigo. Morrendo de fome.

Nessas horas, não há muito o que fazer. Ou se é solidário ou um grande filho da puta. Nem tive tempo de consultar minha consciência. Em menos de cinco segundos, o cara já estava dobrando a Fidalga. Com meu prato na mão.
Só ficou a banana, espetada no meu garfo.

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Meio cachaçado, demorei pra entender o que estava acontecendo. Quando olhei para trás, vi o Juarez correndo e gritando “Pega Ladrão!”, “Pega Ladrão!”. Tentei correr. O negroni não deixou.

O Juarez voltou bufando, apontando para um carro, parado em frente ao restaurante.

– Entra, aí. Tom. Vamos pegar esse filho da puta. Ele desceu a Aspicuelta.

Eu não sei se o mendigo era um ex-velocista que tinha perdido o patrocínio do Banco do Brasil ou se a vontade de comer o arroz biro biro era tanta que o cara encarnou o Usain Bolt. Só sei que o cara sumiu. Rodamos uns dez minutos pela Vila. Mais por vontade do Juarez, que não se conformava:

“Porra, Tom. Roubar a comida de alguém? Isso na minha terra acaba em morte.”

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Desistimos da busca. Na volta, para a nossa surpresa, vimos o mendigo sentado, encostado na parede de uma farmácia da Harmonia, tomando sol, com as pernas abertas. Do lado, meu prato. Vazio. Nos aproximamos. Pedi calma pro Juarez. Não era o Fabrício Queiroz. Era um mendigo.

O cara viu a gente e sorriu. Enormes lábios amarelos, cor de ovo.

– Eu adoro geminha mole.

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Eu também, porra.

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