A poesia morreu outro dia | por Sergio Rocha

#FlautaVertebrada: “mas foi só um faz de conta na hora de deixar atônito o emissário do rei, um drible curto desconcertante, um anel de diamantes perdido entre as faixas e as estações”

Imagem: vyasphoto
por Sergio Rocha

A poesia morreu outro dia. Dia quente como um inferno (e nem sei o que é tão quente como o inferno). Pimentas e desertos serão tão quentes? O cu de um foguete no Cazaquistão, uma ofensiva do estado islâmico? Há quem acredite que naquele dia bastou amordaçar os cães que ladravam seus poemas em praças públicas.
A poesia morreu outro dia, mas foi só um faz de conta na hora de deixar atônito o emissário do rei, um drible curto desconcertante, um anel de diamantes perdido entre as faixas e as estações. Foi também o decreto de uma nova lei que fez aquela estranha estrela entrar pela janela e me fazer pensar se eu seria o mais velho dos cães ou só mais um viajante errando caminhos e portas, buscando nos olhos vazados as respostas de uma imensidão desértica, um pool de regras assépticas, e sim, melhor sepultá-la antes do mau cheiro, antes que passe o lixeiro e varra quase tudo.
Varra
Cucos e eunucos
Brancos sarados
Mancos e caducos
Pretos parrudos
Varra a barra das saias das meninas
E faça de cada santo
Um menino barroco
Um menino teimando em reavivar palavras que não temam o carma para a poesia.

 

Sergio Rocha, paulistano dos altos de Santana, escritor, poeta, jornalista (de)formado pela Filosofia, mas principalmente pai da Mariana, Fernanda, Giovana e avô do Ravi. Tem dois livros publicados, “Terceiro fragmento”, J. Andrade Gráfica e Editora, 2012, Aracaju/Se e “Um poema depois da chuva”, Rusvel-Triver Studio e Editora, 2018, São Paulo/SP. Vem participando de várias antologias impressas e virtuais. Organiza o Sarau Santa Sede, ministra oficinas de criação literária e é editor na Casa Editorial Livrará. Escreve n’O Partisano quinzenalmente aos sábados.

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