O que levou à decisão de Fachin de anular as sentenças de Lula, e o que levou, em primeiro lugar, às condenações sem provas contra o ex-presidente?

por Matheus Dato
Qual seria a razão deste portal apresentar uma série de textos sobre a origem, desenvolvimento e decadência da operação Lava-Jato? Sem dúvida, muitos veículos de comunicação, desde os jornalões burgueses aos mais humildes tabloides, já se posicionaram de alguma maneira. Alguns textos possuem extrema qualidade, outros prendem-se ao senso comum e a esmagadora maioria preocupa-se em servir como assessoria de imprensa desta operação criminosa, confirmando o papel fundamental da mídia na construção da farsa, conforme exploraremos em momento posterior. A razão é muito simples, na realidade: oferecer um meio didático de consulta e estudo aos trabalhadores que desejam compreender de maneira sintética e fundamentada o porquê desta operação, que envolveu toda a superestrutura do Estado, ser apontada como o fato político mais importante do país desde o golpe de 2016.
É um dito comum nos meios progressistas: aqueles que acusam Lula de ser um ladrão não são capazes de dizer exatamente o que ele roubou. Da mesma maneira, o desenrolar jurídico-midiático da anulação dos julgamentos prolatados por Sérgio Moro deixou claro que falta quebrar o silêncio imposto e explicar ao povo como e por que Luiz Inácio Lula da Silva é inocente e vítima de um processo político reacionário. A esta tarefa nos propomos.
A metodologia seguirá da seguinte forma: analisaremos a conjuntura, nos debruçaremos sobre as origens e motivações da operação e apontaremos de maneira explícita as ilegalidades e falseamentos levados adiante pelo poder fascista de Curitiba.
A conjuntura
Cumpre investigar quais as correlações de força na luta de classes que permitiram que uma demanda alegada há mais de dois anos tenha sido julgada pelo Supremo Tribunal Federal de maneira aparentemente repentina. Pode-se dizer de imediato que o momento da anulação das sentenças de Sérgio Moro em relação a Lula não são mera obra do acaso.
Analisando o papel fundamental da classe dominante, é possível perceber três preocupações centrais em relação às atuais circunstâncias: em primeiro lugar, impedir que a pouca capacidade articuladora-política de Bolsonaro colocasse em risco a aprovação do desmonte do Estado brasileiro, atualmente em curso. Em segundo lugar, acumular forças para que as instituições, representantes de um setor burguês majoritário, fossem capazes de enfrentar uma possível escalada dos militares e parcelas da classe capitalista ainda ligada ao bolsonarismo — é preciso lembrar que não somente está aberta a crise no seio do regime, como também esta crise foi impulsionada e ganhou novos contornos com o agravamento da pandemia, a prisão de Daniel Silveira e o problema das vacinas.
Em terceiro lugar, a burguesia parece ter realizado um cálculo frio no que se refere ao papel ativo da classe trabalhadora e seus movimentos organizados. As revelações dos crimes da Lava-Jato expostos pela “Operação Spoofing” elevaram a outro patamar a capacidade de pressão pela liberdade de Lula. Mais importante, o agravamento da crise estrutural do capitalismo brasileiro e o avanço da curva de contágios e mortes deu as condições materiais para que indicativos de greves em categorias fundamentais, mobilizações de centrais sindicais e a cooptação de outros grupos políticos importantes, tais como a Igreja Católica e a OAB, adicionassem relativa força à disposição de luta do proletariado.
Manobra de Fachin fracassou
De tal modo que se torna mais simples de entender a famigerada “armadilha de Fachin”, que em tese pretendia descartar as condenações mais imediatas no caso Lula, preservar a operação e permitir novo julgamento. Não se tratou em momento algum de movimento aleatório do STF ou fruto da engenhosidade dos senhores ministros. O objeto desta manobra sempre foi impedir que a desmoralização pública do regime burguês abrisse espaço para as forças populares ou mesmo para a extrema-direita, o que seria mais provável, a bem da verdade.
Esta armadilha não surtiu os efeitos esperados, visto que a suspeição do juiz Sérgio Moro permaneceu pautada pela Segunda Turma do STF e a simples recolocação de Lula como elemento ativo do jogo político inverteu brutalmente a situação e apresentou um novo ânimo ao campo popular-democrático. Não somente isso, a capacidade mobilizadora de uma pré-pré-candidatura encabeçada por Lula se mostrou um perigoso fator de avanço da consciência política de luta do povo, que encontrou no atual governo apenas compreensão de que é preciso sobreviver.
Desnecessário dizer que a parte mais avançada da classe trabalhadora deve pautar o debate pela esquerda e radicalizar as bases que, agora, tendem a se engajar diretamente na luta. O aumento de mais de 800% (sim, oitocentos) no número de pedidos de filiação ao Partido dos Trabalhadores explicita o que queremos agora dizer.
A burguesia se encontra em uma delicada posição: retoma o apoio ao fascismo militar-empresarial representado por Jair Bolsonaro e sua gangue, ameaçando destruir finalmente os restos do país, ou continua a abrir um conflito contra a ala bolsonarista para firmar um novo ciclo neoliberal sob domínio dos partidos da ordem vigente tradicionais; 1964 e 1994 compõem o dilema do capital brasileiro.
Os gringos não vão desistir
Sendo notável a focalização estratégica do imperialismo estadunidense na América Central por meio da imposição de privatizações e golpes de Estado, não se pode dizer ainda se o apoio à política da burguesia nacional será o mesmo com que puderam contar no golpe parlamentar-militar de 2016. É certo que o império não desistirá de um ponto importante como Brasil, mas as condições de dependência e submissão na América Latina não são as mesmas de outrora. A dinâmica da luta de classes possui seus fluxos e refluxos.
Ao fim e ao cabo, não sendo possível ainda dizer de que maneira a fração predominante da classe capitalista irá reorganizar o seu domínio político sobre os trabalhadores, cumpre apenas ressaltar que as novas circunstâncias impõem uma tarefa dupla aos revolucionários do Brasil: por um lado, garantir pela força que Lula tenho o seu direito de candidatura e liberdade até o pleito, garantir a realização das eleições e o respeito ao processo institucionalizado. Por outro lado, lutar para que não somente Lula seja capaz de aplicar o programa de emergência de seu partido e devolver os direitos mínimos à classe operária mas também utilizar uma nova fase democrática para fazer a intensa agitação entre as massas que se faz necessária para avançar o curso revolucionário da história de nosso país.
Na próxima quinta-feira (18), demonstraremos que a Lava-Jato é uma interferência do imperialismo na política e na economia brasileira, organizada e pensada pelo Departamento de Estado dos EUA e FBI.
Lula Livre! Venceremos!