Colocar um general como eterno ministro “provisório” na Saúde é a escolha perfeita para o projeto bolsonarista, que consiste na destruição de qualquer solidariedade social

por Caio Fabbri
Aos que se queixam de que o país já ultrapassa dois meses sem Ministro da Saúde, vale lembrar que o Brasil tem sim ministro: ele se chama General Eduardo Pazuello. Pazuello foi perfeitamente escolhido para se tornar o ministro interino mais longevo da história da república. Dentre os exigentes critérios pelos quais chegou ao Planalto, constam sua absoluta inexperiência na área da saúde pública, sua total falta de habilidade para lidar com vidas humanas e sua completa subordinação ao presidente.
Não podemos ser inocentes e permanecer cegos quanto ao principal projeto do atual governo, a saber, a consolidação de uma revolução conservadora de contornos abertamente fascistas. Essa agenda implica, entre outras coisas, a destruição de qualquer solidariedade social. Salvar vidas durante uma pandemia, com destaque aos setores mais vulneráveis da população, vai na direção diametralmente oposta a esse projeto. Além disso, Bolsonaro não tem e nunca teve nenhum compromisso de governar de fato, coisa que exigiria do Executivo, nesta crise pandêmica, um sistema de articulações políticas com os estados visando mitigar o contágio, minimizar mortes, etc. Bolsonaro está lá unicamente para mobilizar seu séquito fascista, e milicianizar a sociedade civil e militar.
A escolha de nomear “provisoriamente” um general ao Ministério da Saúde é absolutamente coerente com este projeto: um levantamento recente do Tribunal de Contas da União (TCU) identificou um total de 6.157 militares, somando os da ativa e da reserva, ocupando cargos no governo, incluindo naturalmente os notórios colegas de Pazzuelo que possuem gabinete dentro do próprio Palácio do Planalto (Casa Civil, Gabinete de Segurança Institucional, Secretaria de Governo e Secretaria Geral), sem contar ainda outros seis ministros com carreira militar. Bolsonaro nunca escondeu sua paixão pela ditadura e a essa altura já deveria ser óbvio que ele pretende reconstituir os gloriosos “anos de chumbo”, com a diferença tétrica de que sua versão busca trazer à superfície os porões ensanguentados do regime militar.
Recentemente, assistimos à meteórica ascensão e queda do também militar Carlos Decotelli, no Ministério da Educação. Seu nome foi saudado por alguns setores ditos esclarecidos da sociedade brasileira. Entusiasmados, trataram de destacar seu caráter técnico e seu extenso currículo, que naturalmente o colocava em patamar muito superior ao de seu antecessor, o olavista tresloucado Abraham Weintraub. Entre tantos atributos, pesava ainda o fato de ele ser negro. Para além do vexame que foi esse crédito ao “histórico técnico” de Decotelli, que instantaneamente se mostrou falsificado, parece que essas pessoas se esqueceram da personalidade racista de Bolsonaro. A nomeação de um negro em um governo como esse representará sempre mais um “capitão do mato”, como o são o fiel deputado bolsonarista Hélio Lopes, ou o constrangedor Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares. A presença negra no governo Bolsonaro jamais representará uma inclusão racial.
Portanto, camaradas, soa quase infantil reclamar da ausência de um Ministro da Saúde. Mesmo que se resolvesse ignorar os argumentos já expostos, o simples voto de confiança e esperança nesse governo, de que por ventura, num arroubo de consciência, nomeasse alguém competente, seria algo desonesto com a nossa inteligência. Bolsonaro é nosso inimigo, e devemos tratá-lo como tal. Ele e qualquer um que faça parte de seu governo assassino.