Por que Alckmin?

Ex-tucano não traria votos, nem acrescentaria muito em apoio do mercado, que em parte Lula já tem, quais seriam, então, as razões para tê-lo como vice?

Imagem: O Partisano
por Alexandre Lessa da Silva

Os partidos, federações e coligações têm até o dia 15 de agosto próximo para requererem o registro dos candidatos a presidente e a vice-presidente da República. Assim, ainda há algum tempo, se bem que pouco, para o PT escolher definitivamente quem será o vice de Lula nas eleições desse ano. Pelas conversas que estão sendo costuradas por Lula e a cúpula do partido, cada dia ganha mais força o nome de um dos fundadores do PSDB: Geraldo Alckmin. Alckmin está atualmente em busca de um novo partido, levando em conta a grande possibilidade de ser o vice de Lula. A data limite da escolha está chegando, assim como as próprias eleições, e a chapa Lula/Alckmin é, pelo menos até agora, a mais provável de ser escolhida pelo Partido dos Trabalhadores, o que causa uma imensa estranheza para boa parte da esquerda. Afinal, o ex-governador de São Paulo é um político, todos sabem, de direita, que apoiou o golpe contra Dilma e que tem a cara do PSDB. Mas, afinal, por que Lula insiste em ter Alckmin como vice?

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Antes de dar prosseguimento ao artigo, é necessário frisar que não se trata de uma crítica ou um apoio ao nome de Alckmin, mas de uma análise dos motivos que estão levando Lula e seu partido a defender o ex-tucano como candidato a vice em sua chapa, nada mais que isso.

Alckmin, pelo que as pesquisas indicam, não acrescenta eleitores àqueles que pretendem votar no petista. Assim, a escolha do ex-governador para vice não seria uma tentativa de ganhar os votos do centro, como muitos afirmam, uma vez que esses votos já estão, pelo menos no momento, em sua grande maioria com Lula, seja lá quem for seu vice. Se Lula perder a maioria dos eleitores de centro, não será pelo fato de Alckmin ser ou não seu vice. Dessa maneira, a hipótese de conseguir mais votos com a chapa Lula/Alckmin não é suficientemente fundamentada para que o PT opte por tal político como vice.

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A segunda hipótese, também muito defendida, é que o PT está tentando sinalizar para o mercado, esse verdadeiro ente fantasmagórico, que não há o que temer com uma nova vitória de Lula. Entretanto, boa parte do mercado já conhece Lula e o aceita, muito mais que Bolsonaro. Com a inviabilidade cada vez maior de um candidato de direita ou centro-direita, chamado de “terceira via” pela mídia corporativa, a disputa está entre Lula e Bolsonaro e os nomes do mercado, a essa altura do campeonato, já se decidiram por um ou por outro. Portanto, também não faz muito sentido escolher o nome de Alckmin para vice com base no mercado.

Conquistar eleitores bolsonaristas poderia ser mais uma hipótese, mas todos sabem que Alckmin não ajudaria em nada nesse cenário. Bolsonaro tem um núcleo de eleitores fiéis de cerca de 15% e mais outros tantos que tendem a votar no atual presidente. O nome do ex-governador paulista não faz nenhuma diferença nesses casos, o que só confirma a inutilidade de sua escolha nesse caso.

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Uma nova alternativa é de que Alckmin deixa a figura de Lula mais conciliadora e, portanto, o afasta de um perfil extremista. Essa não é uma hipótese ruim, mas peca por três coisas. A primeira é que Lula está longe de ser alguém sectário ou de estar no extremo do espectro político. A segunda e mais importante, já que se poderia argumentar que a questão é a aparência e não a essência, é que quem considera Lula extremista são aqueles que votarão em Bolsonaro ou, talvez, em Moro, e esses votos já estão perdidos. A terceira é que isso poderia ser feito sem escolher uma figura tão emblemática quanto Alckmin. Dessa forma, apesar de não ser uma má hipótese, não seria suficiente para explicar a escolha de Geraldo Alckmin.

O problema de todas essas hipóteses é que elas só levam em conta os eleitores, a eleição e seu financiamento, legal ou não. Há outros atores no palco, além daqueles que estão diretamente visíveis. Bolsonaro sabe disso e permanece agarrado como um piolho a um dos atores que considera fundamental, aquele que veste farda. Ainda há pouco, anunciou que pretende ter o general Braga Netto como seu vice, visando ter a garantia que o Exército estará ao seu lado. Mas, o ator mais importante nesse cenário não está nas Forças Armadas.

Caso Bolsonaro conseguisse, além do apoio das Forças Armadas, a confiança do Império, as eleições teriam pouco valor no futuro político do Brasil e um novo golpe, dentro do golpe, seria consumado. Para infelicidade de Bolsonaro, Trump perdeu a eleição presidencial estadunidense e, com isso, os atritos entre o novo governo dos Estados Unidos e Bolsonaro começaram a surgir. Todavia, ninguém sabe se tais atritos são suficientes para impedir um apoio a Bolsonaro e, em função disso, todo cuidado é pouco em relação aos movimentos do Império em relação às eleições desse ano no Brasil.

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Então, a indicação de Alckmin como vice tem uma grande possibilidade de ser mais que um sinal, ser um compromisso, um ato concreto de que um futuro governo petista não representaria um problema para os interesses do Império e, com isso, evitar uma interferência estadunidense em favor da extrema direita brasileira. Lula tem pleno conhecimento do papel maior dos Estados Unidos no golpe contra Dilma e sabe muito bem como Trump planejou e estruturou a vitória de Bolsonaro na eleição de 2018. Vale lembrar que Lula condenou a ação da Rússia em relação à Ucrânia, antes mesmo que o governo brasileiro tivesse cedido às pressões estadunidenses, demonstrando um estranho alinhamento, mas que parece ser extremamente necessário para o seu futuro político.

Um comentário

  1. O distinto eleitorado inda não percebeu o alcance do seguinte fato: o PT é essencialmente um partido paulista – apesar de jamais ter governado o estado -, e Lula é um político paulista.
    Sem a concorrência de Alckmin, o PT, com Haddad, tem a grande chance de finalmente ocupar o Palácio dos Bandeirantes, o sonho de consumo PT-SP, a facção que de fato comanda o partido. Essa é a razão de Lula ter escolhido o neoliberal golpista Geraldo Alckmin para a vice-presidência.
    Tudo mais que se alega é conversa pra boi dormir.
    Porém, Alckmin de vice será meio caminho andado para um golpe nos moldes do de 2016. Ou será que ninguém percebe que o contexto internacional é favorável a um novo golpe?
    A política externa dos Estados Unidos é hoje extremamente temerária e agressiva. Se o governo Biden chegou ao ponto de exercer pressão militar contra a Rússia – arriscando até mesmo a possibilidade de um conflito nuclear – e, simultaneamente, antagonizar a China, alguém acha que teriam algum pudor em remover Lula e substituí-lo por Alckmin?
    Lula se coloca voluntariamente como refém. O Palácio dos Bandeirantes vale o risco?
    Haja paroquialismo.

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