Lula e Biden

Os elogios a Biden, feitos por Lula durante a entrevista à CNN original, não são sinais de ingenuidade, o ex-presidente conhece muito bem o campo minado que está passando

por Alexandre Lessa da Silva

Os últimos grandes acontecimentos nacionais embaralharam o jogo político no país. O ministro Edson Fachin, do STF, decidindo que a Décima Terceira Vara Federal de Curitiba e o ex-juiz Sergio Moro, seu titular à época, não tinham competência para julgar as ações do tríplex do Guarujá, do sítio de Atibaia, das doações e do terreno que envolvem o Instituto Lula, anulando, assim, as condenações do ex-presidente. A Segunda Turma, do mesmo tribunal, decidindo pela suspeição de Moro, no caso do triplex do Guarujá. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ameaçando Bolsonaro com “remédios políticos amargos” e, talvez, “fatais”, como o impeachment. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), pressionando para a saída do chanceler Ernesto Araújo, criticando Bolsonaro, investigando e exigindo a saída de Filipe Martins, assessor da Presidência. Todos esses acontecimentos são favoráveis a Lula e são péssimos para Bolsonaro, o que remete à necessidade de uma análise urgente de todas essas atitudes. Afinal, qual a origem dessas derrotas que os outros Poderes impuseram ao comandante do Executivo?

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A pandemia avassala o país com mais de 310 mil mortos e número de mortes diárias já passando de 3 mil. O Brasil é o epicentro mundial da COVID-19, com o surgimento de diversas mutações no vírus SARS-CoV-2 e a falência do sistema de saúde. Entretanto, todo esse caos sanitário não teve um impacto social e eleitoral correspondente, continuando a maioria da população contrária, segundo as últimas pesquisas, ao impeachment de Bolsonaro. Fato curioso, pois essa mesma maioria o considera incompetente para governar o país, uma prova de que se “a voz do povo é a voz de Deus”, então Deus precisa fazer um cursinho de lógica.

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No campo econômico, a inflação oficial fechou com a maior alta desde 2016, 4,52%, num país que já teve os seus dados econômicos questionados pela Financial Times, levantando séries dúvidas pelas informações repassadas pelo governo que está aí. Também o PIB brasileiro demonstrou a fragilidade dessa administração, queda de 4,1% em 2020. O desemprego é outro índice que bateu recorde em 2020, atingindo 13,4 milhões de pessoas. Como todos sabem, a realidade econômica é muito pior do que aquela que os números descrevem, basta sentir na pele, especialmente para as classes mais baixas. Todavia, nada disso é suficiente para explicar a mudança de postura dos outros Poderes em relação ao Executivo, nem mesmo a carta da elite econômica pressionando o governo ou o novo auxílio emergencial diminuto, uma vez que a população se mantém inerte e a carta não traz nenhuma ameaça substancial.

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O único fato realmente relevante foi a mudança de governos nos Estados Unidos. Esse é um acontecimento que mudou a política brasileira, mas que devemos olhar com o máximo cuidado, pois Joe Biden está longe de representar algo novo na política de dominação estadunidense.

A questão não é de saber se Biden é um “um respiro para a democracia mundial” ou não, mas de reconhecer que a vitória de Donald Trump representaria a reeleição de Bolsonaro ou um autogolpe no país. A eleição de Biden desestabilizou e enfraqueceu Bolsonaro, indicando que ele já não mais teria total apoio para uma ação totalitária no Brasil. Entretanto, já se pode notar que o seu liberalismo tem limites. Através do Twitter, o secretário de Estado de Biden, Anthony Blinken, já sinalizou que os Estados Unidos estão “profundamente preocupados com os crescentes sinais de comportamento antidemocrático e politização do sistema legal na Bolívia”, fazendo referência à prisão de Jeanine Añez, ex-presidente da Bolívia que conseguiu o cargo através de um golpe em Evo Morales.

A vitória de Biden foi importante, mas agora a esquerda precisa estar atenta para ele e aproveitar sua força para enfraquecer Bolsonaro. O presidente brasileiro já representa um grande estorvo para todo o mundo, em especial para os Estados Unidos. Bolsonaro também é alguém desprezado pela maior parte da opinião pública estadunidense, ao contrário de Lula, ainda lembrado por alguns como “o cara”, mesmo com Obama tentando desfazer essa imagem com seu novo livro.

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O discurso de Biden rejeita, naturalmente, aquele de Bolsonaro, mas também rejeita a maioria das propostas da esquerda. Portanto, a esquerda brasileira está pisando em ovos, e Lula sabe disso. Os elogios a Biden, feitos por Lula durante a entrevista à CNN original, não são sinais de ingenuidade. Pelo contrário, Lula conhece muito bem o campo minado que está passando, mas também sabe que é o único caminho, caminho que mesmo assim é melhor que aquele proposto anteriormente pelo ex-presidente republicano.

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