Mas, afinal, qual punição está prevista para o ministro por lucrar R$14 milhões de reais com a valorização do dólar? Na prática, nenhuma

por Luca Uras
A revelação recente feita por um consórcio internacional de jornalistas, nos chamados “Pandora Papers”, de que o ministro da economia, Paulo Guedes, mantinha uma empresa nas Ilhas Virgens Britânicas, conhecido paraíso fiscal, levanta algumas dúvidas sobre a moralidade já bem questionável de nosso “quadro técnico” da economia. É importante esclarecer que manter contas offshore não é crime no Brasil. Tem até jornal tentando normalizar a prática. O que entra em questão, nesse caso, é a credibilidade de um homem que, enquanto mandatário da economia do Brasil, lucrava milhões com a desvalorização do real.
Guedes já havia, em fevereiro de 2020, afirmado que a alta do dólar era algo positivo. É o que chamamos no cinema de foreshadowing. Mas, afinal, qual punição está prevista para o ministro por lucrar R$14 milhões de reais com a valorização do dólar? Na prática, nada. O que ele fez não é exatamente crime, mas fere o Código de Conduta da Alta Administração Federal: o artigo 5° dispõe que “É vedado o investimento em bens cujo valor ou cotação possa ser afetado por decisão ou política governamental a respeito da qual a autoridade pública tenha informações privilegiadas […]”. Infelizmente a punição só vem em forma “recomendação de demissão”. Dificilmente a polêmica vai se traduzir em algo concreto, afinal “o Brasil não pode se dar ao luxo de perder um quadro como Paulo Guedes”.
Para jogar um pouco de sal na ferida, também vale lembrar que foi exatamente Guedes que negociou a retirada da proposta de mudança na tributação de contas offshore da PL 2.337/2021, aprovada no início de setembro. Com a mudança, o tributo seria cobrado anualmente, e não só na hora do saque dos valores, como é agora.
Dentre outras personalidades que também tiveram segredos revelados nos Pandora Papers, destaca-se Luciano Hang, empresário e um dos principais aliados de Bolsonaro, que esteve na mira da CPI da Pandemia. Foi descoberto que Hang, por mais de 17 anos, manteve uma empresa de R$416 milhões de reais escondida da Receita Federal, até 2016, quando a lei de Repatriação de Recursos deixou as
condições para declarar dinheiro no exterior mais favoráveis. São milhões de reais sonegados pelo empresário “patriota”, que usava sua empresa Abigail Worldwide para investir em empresas brasileiras como Vale, Petrobras e Natura.
Outros nomes importantes citados nos papéis vazados são o de Paula Marinho, neta do fundador do Grupo Globo, cuja offshore é declarada na receita, e Tutinha e seu irmão, sócios da rádio Jovem Pan, e que não responderam se sua empresa no paraíso fiscal é regular ou não.