Ao invés de aceitarem a derrota na Guerra Civil, mais de 20 mil Confederados se mudaram para o Império do Brasil para estabelecer colônias escravocratas

por Morgan Dunn, na All That’s Interesting, com tradução de Paula Fernanda
A controvérsia sobre a continuação ou não da escravidão dos negros foi o grande motivo para o conflito mais sangrento dos Estados Unidos. Em apenas quatro anos a Guerra Civil, ou Guerra de Secessão, contou com cerca de 650 mil baixas, um dos mais devastadores da história do país. Como comparação, o número de baixas na Guerra do Vietnã foi de 58 mil. De um lado estavam os Estados Confederados do Sul, que lutavam pela secessão – ou seja, pelo separatismo. Do outro, lutava a União Federativa – ou Estados Unidos da América – que desejava manter o país unido. Os estados do norte foram os vencedores do conflito, ocupando as terras e posses dos sulistas e forjando ali o sentimento de identidade nacional americano que conhecemos hoje, baseada na “superioridade” do mundo do Norte, unificado a partir da luta armada. (N.T.)
Com o final da guerra, em 1865, os estados do Sul estavam em ruínas, com sua economia e infraestrutura totalmente arrasadas e assim se sentiam os seus soldados confederados. Para alguns, como Coronel William Hutchinson Norris and o Major Lansford Hastings, essa carga era demasiada. Eles não podiam suportar viver sob o que consideravam ser uma ocupação estrangeira (dos americanos do Norte), e decidiram fugir para o Brasil, na época um Império, e estabelecer aqui uma colônia própria de Confederados, um reduto de sulistas americanos em plenas terras tupiniquins. Ao final, cerca de 20 mil Confederados se estabeleceram por aqui.
O Êxodo dos Confederados
As ruínas do entreposto ferroviário de Atlanta eram um exemplo típico da destruição que estimulou muitos dos confederados a emigrar. Jefferson Davis e Robert E. Lee haviam tentado fazer com que os sulistas ficassem nos antigos estados da confederação e o reconstruíssem, mas aqueles que eram muito orgulhosos para aceitar a derrota, ou os que tiveram suas terras confiscadas pelas autoridades federais, provavelmente sentiram que tinham pouca chance de desenvolvimento, a não ser começar uma vida do zero em outro país. Os destinos mais populares incluíam Honduras, México, e até o Egito, para onde alguns oficiais aliados foram convidados para assumir comissões militares. Mas, para aqueles que estavam convictos da supremacia branca, apenas o Brasil poderia oferecer a eles o paraíso que estavam procurando.
O Imperador do Brasil, Dom Pedro II, encorajou a fixação dos Confederados ao mesmo tempo em que atuava para abolir a escravidão. Era de grande interesse para o Império português e a família real atrair a vinda de estrangeiros para o Brasil naquele momento. Ele havia oferecido portos seguros para os navios confederados durante a guerra, e apesar de sua oposição pessoal à escravidão, não hesitou em abrigar refugiados escravocratas e rebeldes para cultivar algodão e ajudar a modernizar a agricultura brasileira.
Distribuindo anúncios em jornais por todo o antigo estado Confederado, Dom Pedro levou em consideração o conselho do cativo Davis e do derrotado Lee de criar uma imagem de um país rico e selvagem pronto para a ocupação e amigável à escravidão. O Império ofereceu transportes subsidiados e terras disponíveis pela barganha de 22 centavos por acre. Milhares de Sulistas foram fisgados pela estratégia. Eles imediatamente venderam suas posses e vieram para o reino mágico prometido por Dom Pedro II.
William H. Norris, Pai fundador dos Confederados
Foi o Coronel William Hutchinson Norris quem fundou o único agrupamento que sobreviveu no Brasil. Ele foi um dos que mais se empenharam em estabelecer o grupo no exterior, fora do alcance da vitoriosa União. Ex-senador do condado de Dallas, no Alabama, grande mestre da Grande Loja Maçônica no mesmo estado e veterano da guerra Mexicana-Americana, ele estava convicto de que um Estados Unidos Livre não era lugar para sua família. Ele e seu filho Robert chegaram em São Paulo em dezembro de 1865, carregando uma pequena fortuna que se manteve durante a guerra escondida em um buraco em seu quintal – de acordo com a lenda, sua esposa só conseguiu a façanha de manter o tesouro seguro de ser roubado pelos soldados da União pois sabia um cumprimento de mão secreto típico dos Maçons.

Assim que chegaram, compraram três escravos e quinhentos acres de terra perto de Santa Bárbara d’Oeste, município de São Paulo. Em abril de 1866, chegou o restante da família e a campanha para que outros amigos e vizinhos que ainda estavam nos EUA também viessem se juntar a eles na colônia. Em poucos anos, cerca de meia dúzia de povoados confederados estavam estabelecidos nos estados do Pará, Paraná e São Paulo.
Major Lansford Hastings espalhou a notícia da existência desses postos militares no Brasil. Ele publicou o “Guia dos Emigrantes para o Brasil” em 1867, um guia de viagens que prometia riqueza ilimitada a quem fosse corajoso o suficiente de se mudar para o país tropical. Conforme os EUA se recuperavam dos horrores da Guerra Civil, os confederados não-reformados, como os brasileiros os chamavam, se esforçaram o máximo para preservar a ilusão da vida como ela havia sido antes. Eles praticavam o Cristianismo Protestante, cozinhavam como a tradição sulista, falavam inglês, e resistiram fortemente a se misturar com a população local, se mantendo separados com muito afinco.
Os confederados tentam, e falham, reviver seus sonhos de escravidão
Os escravos eram aproximadamente metade da população do Brasil no século 19, atraindo sulistas americanos que sonhavam continuar com a exploração de trabalho escravo. Desde o começo, o sucesso e a duração das colônias sulistas por aqui dependeu das suas habilidades de angariar e controlar escravos. O Sul dos EUA e o Brasil mantiveram a escravidão em comum por um bom tempo. De fato, em meados do séc 19, mais de 40% das vítimas do comércio de escravos do Atlântico acabaram nas plantações de cana-de-açúcar brasileiras, vastíssimas, onde o seu trabalho era utilizado para adoçar café e chá nas casas e “coffee houses” pela Europa e América do Norte.
Mas, apesar de terem chegado ao Brasil com o apoio do Imperador, eles não conseguiram comprar tantos escravos quanto gostariam. Eles falavam pouco o português e, com poucos fundos e ainda menos conexões pessoais no país, eles não conseguiram possuir as vidas humanas necessárias para fazer ressurgir o sistema de agricultura, chamado Plantation, por aqui.
O fim dos povoados confederados
Conforme as lideranças das colônias individuais faliram financeiramente ou morreram de doenças, seus seguidores foram se juntando às outras colônias, especialmente a chamada Villa Americana, em São Paulo, aquela fundada pelo Coronel William Hutchinson Norris. Em 1877, tropas federais foram afastadas de suas tarefas nas ocupações dos estados sulistas, retirando assim a maior proteção que os cidadãos negros livres tinham naquele momento. Não se sabe quantos sulistas exilados voltaram para casa nos anos seguintes. O que é conhecido é que muitos dos assentamentos antigos debandaram, e muitos, ou se juntaram à colônias maiores ou voltaram para um Sul faminto por recebê-los de volta. Aqueles que ficaram se tornaram mais próximos, com a intenção de proteger sua herança mesmo após a abolição da escravidão, em 1888.
O legado dos Confederados
Embora os confederados (entre 10 a 20 mil que aqui chegaram) falharam em construir seu tão sonhado reduto, eles deixaram uma profunda e durável impressão nos estados em que se estabeleceram, com suas contribuições na agricultura, tecnologia e sociedade reconhecidas ainda por muitos anos depois. Muitos de seus descendentes afirmam que o Brasil teria estagnado sem essas contribuições, e, apesar de isso não ser exatamente verdade, eles de fato colaboraram para acelerar a adoção de tecnologias e inovações que estavam chegando recentemente no país, como trilhos e arados de ferro.

É possível que a Villa Americana de Norris tivesse acabado, assim como as tantas outras que surgiram, não fosse a presença de uma das mais antigas ferrovias por perto, permitindo que os habitantes locais pudessem exportar seu algodão e ajudando o país a se tornar um líder mundial na produção têxtil. Nos anos que se seguiram à sua chegada, os confederados logo foram engolidos por ondas massivas de imigrantes que chegaram da Alemanha, Itália e Japão, cada um trazendo suas próprias contribuições e deixando marcas ainda mais óbvias na sociedade brasileira, colaborando para o seu crescimento e desenvolvimento como um dos países mais bem sucedidos da América Latina.
Ainda hoje, apesar de diminuírem e se misturarem cada vez mais à identidade brasileira, os seus descendentes reúnem centenas de pessoas a cada ano para celebrar sua ancestralidade. Vestidos com roupas da época e uniformes confederados, eles comem comidas típicas, dançam a música pré-guerra e balançam a bandeira dos derrotados sulistas em um tributo a uma das imigrações mais esquisitas das Américas.
Sou estudioso de história. Sei do incentivo aos imigrantes é de sua importância para o Brasil. Mas desconhecia essa parte dos imigrantes dos EUA. PARABENS.
Viva a Monarquia brasileira morte a escravidão